Outrora considerada uma moda passageira, a alimentação à base de plantas é agora um grande movimento. Mas será que se afastou muito das suas raízes éticas?
Quando Olívia, uma jovem de 19 anos, chegou à loja onde trabalhava – parte da cadeia de padarias Greggs – para o seu turno das 10h30 a 3 de Janeiro de 2019, pareceu-lhe que estava a entrar num cenário de Guerra. Os colegas do turno da madrugada não tinham ainda retirado o menu do pequeno-almoço e o frigorifico das bebidas estava vazio. Olívia diz que havia tantos clientes, que alguns operadores de caixa não conseguiram fazer a pausa da manhã.
Naquele dia, a cadeia Greggs lançou o seu primeiro pão com salsicha vegan em 950 das suas 1950 lojas – a filial da estação de autocarro de Yorkshire era só uma delas.
“Foi de loucos.”, diz Olívia. “A loja abriu às 6h30 da manhã e a procura não diminuiu até às 5h30 da noite…estávamos completamente esgotados.”
O pão com salsicha vegan Greggs – feito em colaboração com a empresa de substitutos de carne Quorn, que conta já com 34 anos de existência – é o novo produto da padaria que mais vende em seis anos. Menos de uma semana após o teste de venda, a Greggs actualizou a sua previsão de lucro para 2019 de 86 milhões de libras para 88 milhões de libras, e as acções da empresa aumentaram 7.7%.
Nos últimos anos, a comida vegan tornou-se extraordinariamente popular. Em 2018, a Vegan Society registou 9590 novos produtos como vegan – o que significa um aumento de 52%, desde 2017, nos produtos desta marca oficial. Só em Setembro de 2018, a Islândia lançou a linha vegan de congelados chamada No Bull; a Magnum lançou dois gelados de proteína de ervilha; a Hellmans começou a vender maionese vegetal; a Pizza Express apresentou uma nova pizza vegan e a Costa Coffee lançou um biscoito vegan. Todos os grandes supermercados britânicos anunciaram ou expandiram uma variedade vegan em 2018. Um dia antes da Greggs lançar o seu pão com salsicha, a Marks & Spencer lançou 60 pratos diferentes para a gama Plant Kitchen.
Lang diz que a pesquisa científica que está disponível em quase todo o lado sobre a forma como a indústria da carne e dos lacticínios prejudica o nosso planeta, animais e organismos leva a que os consumidores façam escolhas mais informadas.
“O processo de desenvolvimento foi muito, muito rápido.” explicou Claire Richardson, a responsável pelo desenvolvimento de produto da Plant Kitchen.
“Foram menos de quatro meses – que é provavelmente menos de metade do tempo que normalmente demoramos a desenvolver uma gama.”
Estamos no meio de uma “corrida vegan”. Uma moda alimentar que antes era para uma minoria, foi agora consumida pelo capitalismo – mas como e porquê? Enquanto um número recorde de 250.000 pessoas participaram no Veganuary 2019 – uma iniciativa que ocorre durante o mês de Janeiro, onde as pessoas seguem uma dieta exclusivamente à base de plantas – a Vegan Society diz que, em geral, os vegan representam apenas 1% da população do Reino Unido. Porque é que as empresas se “atropelam” por causa de um nicho de Mercado?
“A indústria alimentar é implacável e cirúrgica no que respeita a estar atento a tendências e modas.”, diz Tim Lang, professor de politica alimentar na Universidade de Londres e autor de “Food Wars: The Global Battle for Mouths, Minds and Markets”. “É esta indústria que vai tirar as coisas de dentro dessa minoria e normalizá-las um pouco mais”. Ainda que o veganismo seja considerado uma “franja”, o relatório de comida e bebida do ano de 2018 da Waitrose concluiu que um terço dos britânicos reduz deliberadamente o seu consumo de carne e os analistas da IGD (The Institute of Grocery Distribution) relatam que 52% dos consumidores britânicos estão interessados em tornarem-se vegetarianos, vegan ou flexitarianos.
Os flexitarianos são pessoas que reduzem bastante o seu consumo de carne, mas não são radicais em relação a isso. Lang diz que a pesquisa cientifica que está disponível em quase todo o lado sobre a forma como a industria da carne e dos lacticínios prejudica o nosso planeta, animais e organismos leva a que os consumidores façam escolhas mais informadas. No entanto, o apetite por alimentos vegan é muito maior do que o apetite pelo veganismo em si.
“É bastante claro que esta não é apenas uma gama para vegan”, diz Claire Richardson, da Marks & Spencer. “Esta é uma linha para todas as pessoas”.
Richardson diz que o supermercado testou, junto dos clientes, diferentes nomes de marcas até que optaram por Plant Kitchen.
“A palavra “vegan” pode ser desmotivante para os consumidores quando pensam em comprar um determinado produto. “À base de plantas” já é um termo com que a maioria das pessoas se identifica.” diz ela. “Eu acho que o termo “vegan” tem algumas conotações com os direitos dos animais e outras questões com as quais o consumidor pode não estar necessariamente de acordo.”
Depois da DEFRA (Department for Environment, Food and Rural Affairs) relatar que em 2017 a venda de carne tinha diminuído 7% desde 2012, os supermercados voltaram-se para produtos à base de plantas de forma a aumentar os seus lucros. “A Escola de Frankfurt (teóricos sociais marxistas) começou a falar sobre isso nas décadas de 1930 e 40”, diz Lang. “É a capacidade que o capitalismo tem de incorporar os seus inimigos e melhorá-los.”
Arthur Ling decidiu tornar-se vegan em 1926 – 18 anos antes de existir um termo que o definisse – motivado pela ética e pela preocupação com o meio ambiente. Ling presidiu a recém-formada Plantmilk Society em 1956, ajudando a popularizar o leite de soja no ocidente. Mais de 60 anos depois, a Plantmilk transformou-se na Plamil Foods, uma empresa de Kent que produz leite de soja, maionese sem ovos e chocolate sem lacticínios.
“Nessa altura existiam dezenas de vegans em todo o país, agora há milhões.” diz Adrian Ling, filho de Arthur Ling e director da Plamil Foods. Ling diz que a empresa teve um crescimento exponencial no último ano (dobrou a produção da maioria dos seus produtos desde o inicio de 2019), ainda assim, Adrian não se quer desviar dos princípios que motivaram o seu falecido pai.
“Produzimos tudo da forma mais ética possível. Usamos energia renovável”, diz ele. A empresa tem inclusivamente uma politica de ética disponível no seu website, onde se compromete a reciclar resíduos, renunciar a paraísos fiscais e usar apenas cacau fairtrade nas suas barras de chocolate.
A Alpro, uma das maiores marcas de bebidas alternativas, é propriedade da Danone – uma empresa multinacional francesa com uma participação de 24,4% no Mercado mundial de produtos lácteos frescos. “Nos meios de comunicação, as pessoas começam a perguntar para onde vai o dinheiro”, diz Ling. “Esse dinheiro está a entrar no pote do lucro que é investido na indústria da carne ou dos lacticínios?”
Quando a recém fundada Vegan Society delineou os seus princípios em 1951, definiu o veganismo como “a doutrina de que o homem devia viver sem ter que explorar os animais”. Durante 70 anos, o veganismo tem sido essencialmente impulsionado pela ética. No entanto, assim como o feminismo moderno – que neste momento está híper capitalizado e que se desvia das raízes mais revolucionárias do movimento, (em 2014, o Mail on Sunday, divulgou que as t-shirts de 45 libras (cerca de 42€) da Whistle que tinham escrito “This Is What a Feminist Looks Like” eram feitas numa fábrica nas Maurícias por mulheres que ganhavam 62 pence à hora (equivalente a cerca de 0.70 cêntimos) – também o veganismo começa a causar algumas preocupações.
O que é que se perde quando quem ganha mais com o veganismo são os que já ganhavam mais?
“Os produtos vegan estão há muito anos nas prateleiras das lojas de alimentos saudáveis e agora estão em supermercados convencionais porque as grandes empresas entraram no Mercado e têm força económica para colocar os seus produtos na prateleira” diz Ling. “Isto é óptimo para o veganismo, mas para onde vai o dinheiro?”
Em Janeiro de 2018, a revista Ethical Consumer alertou os seus leitores sobre gamas de comida vegan pertencentes a grandes empresas controladoras do Mercado de carne e lacticínios. A Alpro, uma das maiores marcas de bebidas alternativas, é propriedade da Danone – uma empresa multinacional francesa com uma participação de 24,4% no Mercado mundial de produtos lácteos frescos. “Nos meios de comunicação, as pessoas começam a perguntar para onde vai o dinheiro”, diz Ling. “Esse dinheiro está a entrar no pote do lucro que é investido na indústria da carne ou dos lacticínios?”
Já se fizeram sentir algumas preocupações sobre as linhas da Marks & Spencer. No passado dia 7 de Janeiro, o supermercado ficou “debaixo de fogo” quando os consumidores repararam que os produtos Plant Kitchen eram rotulados como “não adequados a pessoas com alergia ao leite ou ao ovo”. A empresa explicou que a aquela gama foi aprovada pela Vegan Society, mas que a contaminação nas fábricas pode significar que os produtos podem não estar totalmente livres de ovos e lacticínios.
“Isso está errado” afirma Ling. A Plamil fabrica chocolate sem lacticínios para uma variedade de outras marcas do Reino Unido, (nenhuma delas revelada por Ling), porque as máquinas industriais são difíceis de limpar, o que significa que as fábricas de lacticínios não conseguem evitar a contaminação cruzada entre lotes.
“Acho que os fabricantes devem ser encorajados a seguir uma abordagem completamente livre de ovos e lacticínios”, afirmou Ling. Ele discorda da decisão da Vegan Society em colocar o seu selo nestes produtos que garantem que a contaminação é mínima, porque acredita que isto permite que as empresas sejam negligentes em prol dos lucros.
“Num curto espaço de tempo, o estilo de vida vegan modificou o comportamento do consumidor como nenhuma tendência o fez antes”, afirmou Peter Link, que também faz consultadoria para empresas que tentam entrar neste Mercado. “O negócio do veganismo veio para ficar.”
Peter Link, fundador da primeira revista de negócios vegan do mundo, a Vegconomist (lançada em 2017), diz que como em todos os mercados, o veganismo tem bons e maus jogadores. “Assistimos a uma nova geração de gerentes que implementam aspectos éticos e sustentáveis nos seus negócios vegan. Outros só entram no negócio para recolher os lucros.”, afirma Link. Ele diz que estas margens de lucro são “muito atractivas”.
“As empresas podem cobrar o mesmo ou mais pelas alternativas à carne, ao leite e ao queijo, mas elas conseguem produzi-las a baixo preço”, diz Link.
Em Janeiro de 2018, a Marks & Spencer retirou o seu bife de couve-flor do Mercado – duas fatias de couve-flor com uma pitada de ervas aromáticas vendidas por duas libras, (cerca de 2,50euros), quando uma couve-flor inteira custa 1 libra nos supermercados. Nesse mesmo mês, Hannah Ewens, que é vegan, escreveu num artigo da Vice que a Sainsbury vendia “cogumelos picados” que custavam 1.50 libras e que ainda por cima vinham embrulhados em embalagens plásticas.
Importa onde, o chamado dinheiro do veganismo, vai parar? A Vegan Society é pragmática. “Não nos vamos enganar a nós próprios e achar que as empresas que estão a produzir linhas de alimentos vegan o fazem por motivos de compaixão ou ambientais.”, diz Dominika Piasecka, a directora de comunicação da Vegan Society. Piasecka está satisfeita com o facto de o veganismo ser agora mais conveniente. “Onde quer que se vá, há sempre opções vegan. Isso só pode ser bom.”
Notavelmente, quando a Sainsbury começou a colocar os seus produtos à base de plantas no corredor da carne em 2018, um quarto das pessoas não eram os clientes que habitualmente compravam da secção dos produtos sem carne. “Aumentou a oferta e ajudou os clientes que procuravam fazer uma troca fácil, sem ter de pensar muito.”, diz James Hamilton, um cliente da Sainsbury.
Discutivelmente, podemos afirmar que a mercantilização do veganismo significa que há menos animais a serem mortos para alimentação.
“Num curto espaço de tempo, o estilo de vida vegan modificou o comportamento do consumidor como nenhuma tendência o fez antes”, afirmou Peter Link, que também faz consultadoria para empresas que tentam entrar neste Mercado. “O negócio do veganismo veio para ficar.”
o chamado Mercado “protegido” tem os seus críticos. Ling acredita que “pode haver uma pressa em apontar falhas nos perfis nutricionais” dos novos produtos vegan.
Durante anos, a soja dominava as dietas vegetarianas e vegan. Devido ao seu alto teor de proteína, esta leguminosa asiática era transformada em leite, prensada em tofu, comida em caril, frita, em saladas, etc. Agora é a ervilha que está a ter o seu momento de fama. A proteína da ervilha é utilizada para produzir quase tudo desde gelados, nuggets de “frango”, até ao primeiro hambúrguer vegan mal passado do mundo.
Criar produtos vegan é uma “verdadeira ciência” afirma Heather Mills, ex-modelo e fundadora da produtora de alimentos alternativos VBites, cujas alternativas à carne, peixe e lacticínios são feitas com proteína de ervilha, grão de bico e cogumelos. “fizemos isto durante tanto tempo que descobrimos como podíamos usar ingredientes naturais para que as alternativas tivessem um sabor idêntico ao original.”
NO entanto, apesar do crescente apetite pela proteína de ervilha – o maior produtor Americano fez mais de 76 milhões de libras (cerca de 88 milhões de euros) em 2018 – o veganismo orientado para a saúde não está no centro de boom actual.
“Queríamos focar-nos em algo um pouco mais “sujo” e construir o nosso próprio nicho.” Diz Sarah Augustine, uma gerente de marca que trabalha para os fornecedores de alimentos sediados em Surrey, Winterbotham Darby, que lançaram em Janeiro de 2019, a gama vegan, Squeaky Bean.
Augustine diz que a empresa reparou que “a comida fast-food (suja) vegan” estava a tornar-se cada vez mais popular, assim, a empresa decidiu começar a criar nuggets sem carne ou douradinhos sem peixe.
“Sujo” não é uma palavra que tradicionalmente os marketeers gostem de ver associada aos seus produtos alimentares. Nos últimos quatro anos, a londrina de 29 anos, Lucie Johnson, tem vindo a documentar alimentos vegan pouco saudáveis na sua conta de Instagram “Ugly Vegan”. Ela diz que originalmente o veganismo foi vendido como “saladas elaboradas” e “Buddha bowls”, mas isso não representava a verdadeira experiência vegan.
“Tornei-me vegan porque me preocupo com o ambiente e com os animais – a minha saúde ou o facto de estar na moda nunca foram factores decisivos”, diz Lucie.
Os seus seguidores gostam das suas “refeições tragicamente feias” e mandam-lhe fotografias dos seus jantares sem cor – uma das fotografias mais recentes que Lucie recebeu foi a de um prato de noodles dentro de duas fatias de pão de forma.
Parece que a internet ofereceu às empresas um portal para os verdadeiros desejos dos vegan, (os pães com salsicha da Greggs foram feitos após uma petição online que conseguiu 20.000 assinaturas, e Sarah Augustine da Squeaky Beans diz que a marca consulta instagrammers vegan influentes). O veganismo “sujo” vende.
No entanto, o chamado Mercado “protegido” tem os seus críticos. Ling acredita que “pode haver uma pressa em apontar falhas nos perfis nutricionais” dos novos produtos vegan. Nellie Nichols, uma consultora de alimentos que ajuda marcas a desenvolver receitas e ingredientes de origem há mais de 15 anos, diz que o veganismo “sujo” a deixa nervosa.
No entanto, muitos vegans opõem-se a estas criticas, argumentando que a carne e os lacticínios processados não são conhecidos pelos seus benefícios para a saúde (em 2015, a OMS declarou que comer 50 gr. De carne por dia aumenta o risco de cancro intestinal em 18%). Nichols, observou também que os produtos vegans processados podem ser saudáveis (o leite de proteína de ervilha contém 40% menos açúcar que o leite de vaca) e diz que o aumento da concorrência significa que as empresas estão a tornar-se cada vez mais inovadoras no que toca às alternativas à carne.
“Presentemente faço coisas “à Willy Wonka” porque é isso que me é pedido.” diz Nichols. Por exemplo, neste momento está a ajudar um fornecedor a desenvolver uma receita de salmão fumado feito a partir de cenouras.
“Há tantos processos pelos quais a cenoura tem de passar que acaba por ficar estupidamente caro” diz ela (a cenoura é envolvida em algas, cortada finamente, fumada e novamente fumada). Nichols diz que as alternativas à carne serão cada vez mais inovadoras, caso a popularidade do veganismo se mantenha. “Está na moda, está no “ponto” e os consumidores pagam por isso.”
No dia 3 de Janeiro, as maiores marcas de fast-food do mundo iniciaram uma corrida frenética para perceber quem irritava mais a personalidade mais famosa da Grã-Bretanha, Piers Morgan.
Depois da Greggs ter anunciado o seu pão com salsicha vegan nas redes sociais, Morgan tweetou a sua opinião: “Ninguém está à espera de uma salsicha vegan, seus palhaços.”, escreveu ele. A resposta atrevida da Greggs tornou-se viral: “Olá Piers, estávamos à tua espera.”, e a McDonald’s, a Pizza Hut e a TGI Friday começaram rapidamente a tweetar, em resposta a Morgan, sobre as suas próprias variedades vegan, de forma a beneficiar desta polémica mediática e da publicidade.
O veganismo está envolto numa guerra cultural. Não é nada de novo: em 2016, a Sainsbury alterou o nome do seu queijo vegan para “Gary” depois de um comentário zangado na internet que dizia: chamem-lhe Gary, chamem-lhe o que quiserem, mas não lhe chamem queijo porque não é queijo!”. Os amantes de carne estão cada vez mais zangados com o veganismo. Em Janeiro, o Spectator classificou o veganismo como “Guerra à carne”. Em Outubro de 2018, o editor da revista Waitrose Food, William Sitwell, rejeitou a apresentação de uma jornalista freelance vegan sugerindo-lhe que ela escrevesse um artigo sobre “como matar vegans, um a um.”. A jornalista tweetou o e-mail e Sitwell demitiu-se. Após a confusão se ter instalado, pediu desculpa a todos os vegans, amantes da vida, que se sentiram ofendidos” pela sua piada de mau gosto.
Seja um omnívoro ou um vegan, a dieta está cada vez mais ligada a questões de identidade – tornando-a extremamente comercializável.
Como poderia um pão com salsicha ser entendido como “politicamente correcto”? O professor de politica alimentar, Tim Lang, diz que o declínio da politica convencional e a estagnação dos salários significam que as tradicionais lealdades tribais foram quebradas. “As afiliações a determinados estilos de vida tornaram-se muito importantes. As novas configurações de classe agora são muito mais sobre como vives, onde vives, quais as tuas aspirações. O veganismo encaixa-se nessa mudança cultural.”
Seja um omnívoro ou um vegan, a dieta está cada vez mais ligada a questões de identidade – tornando-a extremamente comercializável. Em Fevereiro de 2019, um anúncio dos fabricantes de carros Hyundai ridicularizou a comida vegan quando colocou um actor a vomitar quando vê um substituto de rolo de carne feito de beterraba. O anúncio deixou a organização de direitos dos animais, PETA, zangada. A organização acusou a empresa de ter “ideias desactualizadas’. O anúncio passou durante a Super Bowl – os anúncios exibidos durante este evento desportivo são tão lucrativos que um anúncio de 30 segundos pode chegar a custar 4 milhões de dólares. Ser anti-vegan é, neste momento, tão lucrativo quanto ser vegan: Sitwell, por exemplo, tornou-se critico gastronómico do Daily Telegraph.
No entanto, não são só as empresas multinacionais e os homens de meia idade furiosos que lucram com o veganismo, mulheres jovens e vegan também, (apenas 37% dos vegans no Reino unido são homens). Tal como Ugly Vegan’s Johnson, tem vindo a surgir uma nova “raça” de vegans famosos no Instagram.
“És pago para comer, o que é que podia ser melhor?” diz a estudante universitária de 21 anos, Gemma Charman, que tem mais de 7000 seguidores na sua conta de Instagram “Addicted to Beans”. Em troca de uma taxa (Charman não revela valores, mas será na ordem das centenas), a estudante publica anúncios de produtos vegan no seu Instagram; recentemente trabalhou com a Squeaky Bean.
“É uma oportunidade maravilhosa ter este trabalho ao mesmo tempo que completo a Universidade”, diz Charman. Tsouni Cooper, uma londrina de 33 anos com 35000 seguidores no Instagram, diz que as adolescentes pedem frequentemente conselhos sobre como se podem tornar num vegan famoso no Instagram.
“Elas perguntam se podem pagar-me para que eu fale sobre elas na minha conta.” diz Cooper. “Eu preocupo-me um pouco com isso.”. Tsouni fez apenas um “punhado” de anúncios pagos na sua conta e já recusou algumas oportunidades com grandes marcas, mas diz que estas jovens vegans cada vez mais querem construir uma carreira a partir do seu estilo de vida. Ela conhece alguns jovens que têm conta no Instagram que foram pagos até 600 libras (cerca de 700€) por uma única publicação.
Se o comum estudante pode ganhar dinheiro a publicar fotografias de feijões e sementes nas redes sociais, há indiscutivelmente um lado positivo neste “casamento” entre o veganismo e o capitalismo. Embora Johnson e Cooper tenham recusado ofertas de grandes marcas, (Johnson diz que o seu veganismo “que se lixe o sistema’ significa que ela dá prioridade a negócios vegan independentes.), todos acreditam que o veganismo corporativo é benéfico para o movimento.
“Há dez anos havia um café vegan em Londres”, diz Cooper. “Eu ficava animadíssima quando havia um hambúrguer vegan num pub. Agora não consigo acompanhar todos os pratos, restaurantes, supermercados, produtos…não tenho problema nenhum com o facto das grandes empresas entrarem na “onda” porque o meu objectivo é tentar fazer com que menos pessoas comam animais.”
“O veganismo é a consequência do capitalismo alimentar ocidental a assombrar-nos”, diz ele. “O mundo não pode continuar a produzir carne a este ritmo sem destruir os ecossistemas. Alguma coisa tem de ceder, e neste momento é o planeta que está a ceder.”
Tim Lang estuda a comida há quase 50 anos e acredita que quem descarta o veganismo por ser uma moda, é tolo. “O veganismo é a consequência do capitalismo alimentar ocidental a assombrar-nos”, diz ele. “O mundo não pode continuar a produzir carne a este ritmo sem destruir os ecossistemas. Alguma coisa tem de ceder, e neste momento é o planeta que está a ceder.”
Com a produção vegan a crescer no Reino unido, a dieta vegan podia ajudar o país a reduzir as importações ambientalmente hostis e ajudar a economia face ao Brexit. “O que estamos a tentar fazer é tornar o Nordeste no Plant Based Valley, um bocado à semelhança de Silicon Valley em Los Angeles, diz Mills da VBite; a marca comprou fábricas em Newcastle e Peterlee o ano passado. Mills revelou que agora fabrica produtos para empresas europeias que temem
A ascenção do veganismo criou muitos vencedores.
A Marks & Spencer está a lucrar, mas Adrian Ling também. O Vbites vai expandir e Link da Vegconomist irá, indubitavelmente, encontrar novos leitores para a sua revista. Nellie Nichols pode continuar a inovar e qualquer pessoa inteligente o suficiente para criar cenoura fumada consegue um bom lucro. Os vegan, a somar às quantias que recebem por publicidade no Instagram, têm uma dieta mais variada e ao longo deste caminho, os animais também beneficiam com o veganismo.
Artigo original: https://www.newstatesman.com/2019/03/how-veganism-went-fringe-food-cult-multibillion-pound-industry