fbpx
Pesquisar
Logótipo AVP Associação Vegetariana Portuguesa

Será que Hitler era realmente vegetariano?

A ideia de que o infame ditador Adolf Hitler foi vegetariano é uma que gera enorme controvérsia desde há inúmeras décadas, e continua a ser objecto de discussão entre amigos e colegas de trabalho, sendo aliás usada frequentemente como arma de arremesso para descredibilizar a alimentação vegetariana. Afinal de contas, quantos de nós já não ouviram a expressão “Mas o Hitler também não era vegetariano”?
sera que hitler era vegetariano

Partilha este artigo:

A controvérsia surge, é claro, da contradição inerente ao facto de uma pessoa tão cruel e sádica ter podido adoptar um estilo de vida amigo dos animais.

No entanto, muitos são os factos e dados históricos que parecem revelar que esta afirmação é falsa,  e que não passou de uma estratégia de propaganda levada a cabo pelo partido Nazi.

Neste artigo, vamos enumerar alguns factos que revelam porque razão Hitler não foi um genuíno vegetariano, e explicar a origem deste mito. Mas antes disso…

Como surgiu o mito?

As referências históricas ao suposto regime alimentar vegetariano de Hitler existem, de facto. Por exemplo, no livro Judaísmo e Vegetarianismo, de Richard Schwartz, este relata como várias personalidades próximas do ditador afirmavam que Hitler fazia refeições vegetarianas para se curar de alguns problemas de saúde, tais como a transpiração em excesso e a flatulência, mas que a sua dieta principal era à base de carne.

No livro A Vida e Morte de Adolf Hitler, considerada por muitos a biografia mais completa de Hitler, o autor Robert Payne defende que o vegetarianismo de Hitler foi uma ficção inventada pelo seu ministro de propaganda, Joseph Goebbels, para atribuir a Hitler a aura de um revolucionário ascético, um género de “Gandhi Fascista”. Payne esclarece o assunto no seguinte trecho:

 “O ascetismo de Hitler desempenhou um papel importante na imagem que ele projectou sobre a Alemanha. De acordo com a lenda amplamente aceite, ele não fumava nem bebia, nem comia carne nem tinha qualquer relacionamento com mulheres. Apenas a primeira informação é verdadeira. Ele bebia cerveja e vinho diluído frequentemente, tinha um gosto especial por salsichas da Baviera e manteve uma amante, Eva Braun, que vivia com ele discretamente em Berghof (…)”.

Robert Payne, autor do livro A Vida e Morte de Adolf Hitler
Livro “The Life And Death Of Adolf Hitler” (Robert Payne, 1973). Créditos imagem: biblio.com

Segundo o biógrafo, o “vegetarianismo de Hitler” não passou de uma estratégia de propaganda, com o objetivo de atribuir a Hitler uma imagem de cidadão exemplar, de forma a ganhar a admiração do povo alemão.

A ideia de que Hitler possa ter sido vegetariana poderá igualmente ter surgido, simplesmente, da ignorância e falta de compreensão do conceito do vegetarianismo. Não é por acaso que, por exemplo, o médico Fritz Redlich, um autor moderno que escreveu um livro chamado “Hitler, Diagnóstico de um profeta destrutivo”, tenha afirmado que este era um vegetariano muito rigoroso, que evitava qualquer tipo de carne, mas que aparentemente abria excepção para um prato da Áustria que ele adorava, os Leberknodl, que são pastéis de fígado. Ou seja, claramente há inúmeros biógrafos que simplesmente não compreendem o que significa ser vegetariano, pois consideram que carne de fígado pode fazer parte da dieta de um vegetariano.

hitler at dortmund rally
Créditos imagem: history.com

Dados que mostram que Hitler não era vegetariano:

Apesar de muitos acreditarem que Hitler foi vegetariano, há alguns dados históricos e referências biográficas que contrariam esta ideia. Vejamos as principais:

  • Vários biógrafos de Hitler, alguns dos quais o conheciam pessoalmente, tais como Robert Payne e Albert Speer, referem nas suas obras que Hitler tinha uma predileção por vários alimentos não vegetarianos, como as salsichas de Baviera, fiambre, fígado, caviar, e carne de caça;
  • O seu prato favorito era pombo recheado, de acordo com a cozinheira Dione Lucas, que cozinhou para Hitler enquanto trabalhava num hotel de Hamburgo durante os anos 30, conforme relata no seu livro de receitas Gourmet Cooking School Cookbook, onde afirma ter sido requisitada várias vezes para preparar este prato favorito de Hitler;
  • Numa publicação de 1937, designada “Em casa com o Fuhrer”, dirigida ao público alemão da época, relata-se o seguinte: “É sabido que Hitler é vegetariano e não bebe nem fuma. O seu almoço e jantar consistem, portanto, na sua maioria em sopas, ovos, vegetais e água mineral, apesar de ele ocasionalmente saborear uma fatia de fiambre e aliviar o tédio da sua dieta com iguarias como o caviar…”
  • Durante o Reich, as associações ou grupos vegetarianos foram proibidos de reunir ou fazer publicações. Uma das principais revistas vegetarianas, a Vegetarian Warte, suspendeu a sua publicação em 1933, por imposição do partido Nazi. Um jornal rival, The Vegetarian Press, continuou a existir durante o período do terceiro Reich, mas foi severamente prejudicado, sendo proibido de usar o termo “movimento vegetariano”, e impedido de publicar a data e o local de encontros vegetarianos. Os vegetarianos, sujeitos a correr o risco de prisão ou pior, eram obrigados a encontrarem-se em segredo, e, além disso, os membros destas antigas sociedades vegetarianas foram sujeitos a buscas domiciliárias, sendo que, durante estas rusgas, a Gestapo até confiscava livros que continham receitas vegetarianas. 

Como podemos ver, Hitler não fez nada para promover a causa do vegetarianismo na Alemanha, tendo, por outro lado, feito tudo para o impedir.

Assim sendo, e perante estes dados, fará sentido continuarmos a persistir na ideia de que Hitler era vegetariano? A não ser que estejamos dispostos a afirmar (erradamente) que o vegetarianismo é compatível com comer, de quando em quando, carne de pombo ou caviar.

122924137 gettyimages 89277106
Crianças no campo de concentração Auschwitz-Birkenau, na Polónia, em 1945. Créditos imagem: bbc.com

Referências

Robert Payne, The Life and Death of Adolf Hitler (New York: Praeger, 1973), pp. 346-7.
Roberta Kalechofsky, “Hitler’s Vegetarianism: A Question of How You Define Vegetarianism,” (Ensaio inédito, 1997).
“Vegetarianism,” The Encyclopedia Britannica, 1911 ed., 27-28, p. 967.
Fritz Redlich, Hitler: Diagnosis of a Destructive Prophet (Oxford: OUP, 1998), pp.77-8.
John Toland, Adolf Hitler (Garden City: Doubleday, 1976), p. 256.
Kalechofsky, op. cit., p.2.
Toland, op cit., p.826. p. 745. p. 821. p. 824-5. p. 824-5. p. 761. p. 741.
Dione Lucas with Darlene Geis, The Gourmet Cooking School Cookbook (New York: Bernard Geis Associates, 1964), p. 89.
Redlich, op. cit., p. 216.

Por Rynn Berry (Historiador e autor de livros sobre vegetarianismo)

Tradução: Ana Borges

Artigo traduzido com a permissão do autor.

Artigo melhorado por Ana Lúcia Almeida.

Original: http://www.vegsource.com/berry/hitler.html

Este artigo teve como base uma versão resumida do livro Hitler: Neither
Vegetarian  Nor Animal Lover
.

Este artigo foi útil?

Considera fazer
um donativo

A AVP é uma organização sem fins lucrativos. Com um donativo, estarás a ajudar-nos a a criar mais conteúdos como este e a desenvolver o nosso trabalho em prol dos animais, da sustentabilidade e da saúde humana.

Considera
tornar-te sócio

Ao tornares-te sócio da AVP, estás a apoiar a nossa missão de criar um mundo melhor para todos enquanto usufruis de inúmeros benefícios!

Queres receber todas as novidades?

Subscreve a newsletter AVP

Mais artigos em

Mais artigos em

Mais lidos

Subscreve

a Newsletter

Não percas um grão do que se passa!