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Vegetarianismo e Saúde Mental

A ligação entre o vegetarianismo e a depressão tornou-se polémica quando se conheceram as conclusões de um estudo publicado no Journal of Affective Disorders - uma revista médica especializada em transtornos afetivos (onde se inclui a depressão). Este concluiu que os vegetarianos são duas vezes mais propensos a desenvolver depressão do que as pessoas que incluem carne ou peixe na alimentação. Mas a questão pode não ser assim tão linear. Possivelmente não é a componente nutricional que está por detrás do risco de depressão nas pessoas vegetarianas.
Vegetarianismo e Saúde Mental

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A polémica criada após a publicação deste estudo não passou indiferente nas redes sociais de quem está, de alguma forma, ligado ao vegetarianismo em Portugal. Nutricionistas, health coaches, criadores de conteúdo, ativistas, entre outras vozes, foram muitos os que deixaram a sua visão sobre o tema nas redes sociais, questionando o artigo em questão e confrontando-o com dados e factos científicos que parecem refutar as conclusões apresentadas. 

Antes de olhar com atenção para este estudo e aprofundar a relação entre vegetarianismo e depressão, importa primeiro esclarecer os conceitos. De acordo com a Organização Mundial de Saúde (OMS), a depressão é um distúrbio mental e uma das principais causas de incapacidade a nível mundial, que pode inclusive levar ao suicídio.

Estima-se que 5% da população mundial adulta sofra de depressão. No caso da população brasileira, em análise no estudo que serve de mote a este artigo, o número é superior: estima-se que 6% da população viva com depressão no Brasil, o que representa 11,5 milhões de pessoas (note-se que este número ultrapassa em mais de 1 milhão a população portuguesa, de acordo com os Censos de 2021). De notar que no estudo em causa, o vegetarianismo é caracterizado como um estilo de alimentação de base vegetal, que exclui carne e peixe e que pode ou não incluir derivados de origem animal (leite, ovos, etc.). 

Agora sim, olhemos para o artigo em traços gerais. Trata-se de uma análise de dados (através do método cross-sectional analysis), obtida a partir do Estudo Longitudinal de Saúde do Adulto (ELSA – Brasil), que concluí que os episódios de depressão são duas vezes mais comuns em pessoas que não comem carne.

Não obstante, os autores deixam a salvaguarda de que eventuais “défices nutricionais não explicam esta associação” e que “a natureza desta associação continua pouco clara, sendo necessários dados longitudinais para clarificar uma relação de causalidade”. 

Em declarações à Associação Vegetariana Portuguesa (AVP), a nutricionista Sandra Gomes Silva começa por dizer que “já há vários anos que sabemos que existe uma associação entre depressão e dieta vegetariana”. No entanto, a especialista deixa claro que “associação não é causalidade, então não se pode dizer que uma cause a outra”.

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O despertar para a crueldade animal e a depressão

Uma das razões que pode conduzir a momentos mais depressivos é o despertar para a crueldade animal.

“Quando confrontadas com o funcionamento da indústria alimentar e a crueldade em si associada, é possível que as pessoas deprimidas tenham maior probabilidade de ruminar sobre esses pensamentos”, defende Sandra Gomes Silva. 

Em declarações à AVP, a especialista em nutrição também dá exemplos de situações sociais como um dos pontos que pode acentuar pensamentos depressivos em pessoas vegetarianas. “Adotar uma alimentação vegetariana pode ser mais ou menos difícil dependendo do círculo de pessoas que nos rodeia: a nossa família, amigos, colegas de trabalho”, descreve.

A sensação de solidão e incompreensão, quando se tem uma alimentação vegetariana, pode ser algo difícil de ultrapassar para alguns vegetarianos. “Muitas pessoas podem sentir-se incompreendidas e desamparadas ao ser alvo de julgamento e crítica por pessoas do seu círculo social. Eventos sociais, que muitas vezes acabam por girar à volta da comida, podem tornar-se extremamente desafiantes”, aponta Sandra Gomes Silva. Apesar destes exemplos, a nutricionista concorda com o estudo quando se diz que é mais provável que pessoas deprimidas se tornem vegetarianas e não a ligação em sentido inverso.  

A qualidade nutricional da dieta e a saúde mental

Sandra Gomes Silva defende que não há evidência científica que prove que a qualidade nutricional da alimentação vegetariana pode estar na origem de situações depressivas.

“Mesmo que possa existir um maior risco de depressão em pessoas vegetarianas, possivelmente não é o valor nutricional da alimentação que está por detrás disso pois, de acordo com o estudo, a associação encontrada não parece ser justificada por carências nutricionais. Assim, outros fatores, nomeadamente sociais, poderão pesar nesta associação”, conclui Sandra.

De acordo com o jornal online Exame Informática, a análise do estudo brasileiro teve em consideração fatores nutricionais, como o total de calorias ingeridas, quantidade de proteína, micronutrientes e até o nível de processamento da comida e “conclui que a ligação à depressão não surge pelo conteúdo nutricional da dieta dos inquiridos”. 

O Global Burden Diseases, um estudo sobre a mortalidade global, mostrou que o número de casos de depressão a nível mundial registou um aumento de 50% entre 1990 e 2017, passando de 172 para 258 milhões de pessoas no intervalo de 27 anos. Mas as razões para este aumento ainda não são claras, até porque os aspetos sociais, psicológicos e biológicos influenciam positivamente o aparecimento da depressão. Vários estudos sugerem que o estilo de vida pode ser um dos mecanismos que despoleta a depressão, podendo aquilo que comemos também ter impacto.

Mais uma vez, a especialista em nutrição reitera que as “estas carências [nutricionais] podem acontecer em qualquer padrão alimentar” e não são exclusivas da alimentação vegetariana como muitos artigos sobre o tema deixaram subentendido. Neste caso, “a evidência científica que existe atualmente não nos permite concluir que a alimentação vegetariana possa causar qualquer problema de saúde mental”, afirma.

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A complexidade da questão

Questionada sobre a situação de prevalência de depressão em pessoas vegetarianas na população portuguesa, Sandra Gomes Silva diz não conhecer “dados em Portugal” e acredita “que seja difícil conseguirmos tê-los, dado que a percentagem de pessoas vegetarianas ainda é baixa”, argumenta. Para a especialista, no panorama português é difícil estudar esta relação porque “amostras mais pequenas podem reduzir a qualidade de um estudo e aumentar a sua margem de erro”.

Diante da complexidade dessa questão, é crucial abordar a relação entre vegetarianismo e saúde mental de maneira holística. A possibilidade de depressão em pessoas vegetarianas deve ser acompanhada por uma avaliação cuidadosa dos fatores individuais, sociais e psicológicos que podem contribuir para o bem-estar mental. Em casos de preocupação, deve-se procurar o acompanhamento de um profissional de saúde e adoptar uma abordagem prudente para entender e enfrentar essas complexidades de forma mais eficaz.

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